segunda-feira, 30 de maio de 2011

There will never be another Dino...

Me acompanha nessa tarde morta um homem,me acompanha no fígado,na alma,no corpo baleado e fora de padrão,ele,o único e incomparável Dean Martin.
Não sei porque algumas pessoas,muitas delas já mortas e que nós nunca conhecemos,nos acompanham o dia todo,do alvorecer até a madrugada,hoje foi a vez dele ficar no meu ombro como um papagaio de pirata,velho Dino,o boêmio,o de alma charmosa e livre do Rat Pack,digam o que quiserem,ele era o melhor,ele era cool,na dele,charmoso como um felino .Ele era uma espécie de consciência entre aqueles bebuns do pacote de ratos,um tipo de aviso,tudo esta bem hoje,tudo tá tranquilo,mas a tragédia tá logo ali ó,uma mulher que vai te largar,um filho que vai morrer numa montanha maldita,não importa o quanto de grana,fama,pau na mesa você tenha fio,o destino,a vida,essa porra tá aí pra te puxar o tapete,se foder é inevitável,nego.
Dean Martin foi um rei,um regente que nunca perdeu o jeito de rir de sí mesmo,se fingia de briaco,entornava muito menos do que fez os outros crerem,brigou com o panaca esquizofrênico do Jery Lewis,ficou amigo do Sammy e do Frank,sacaneou e foi sacaneado,porém nunca perdeu aquela aura principesca,aquele flanar chic que só alguns escolhidos puderam e poderão ter,obrigado Dago(era assim que era chamado pelos rapazes)dedico a você esta humilde carta.

sexta-feira, 27 de maio de 2011

Nelson Rodrigues Onírico

Tive um sonho esotérico e profético.Estava num desses botequins totais com paredes de azulejo azul e torresmos hippies nas vitrinas.Tomava o cafézinho do tipo coador em copo americano tradicional,estou com as costas voltadas para a rua quando o caixa grita em solene e felicissímo êxtase:Olha o óbvio ululante aí gente!- e entra no bar Nelson Rodrigues.
Apesar de saber que Nelson não era mais do nosso mundo fui só compreensão, estava ali o ídolo dos ídolos, o velinho de paletó gasto, andando com certa dificuldade, bate no balcão e pede altivamente:Manda aí uma água, de preferência Lindóia que é água da bica!
Como um Eduardo Santanna espiríta eu não me contenho e ataco vorazmente a celebridade do além:Nelson o que faz entre os vivos nessa manhã de sabádo? Me responde o "flor de obsessão": Mortos são vocês rapaz! O mundo é um armazém de secos e molhados e a morte é o despertar do sonho dos vivos, quandos sonhamos meu caro estamos na verdade olhando o mundo dos mortos pela fechadura, assim como eu sempre vi a nudez e o sexo, como menino perene que é todo homem,além disso hoje é sábado e como diria o jardineiro da minha infância,o sábado é uma ilusão!
Decido então usar Nelson como um oráculo de Delfos do Leme: Nelson, me diga aí o futuro politíco do Brasil?-me responde o grande:O fato de eu estar morto não me faz um vidente meu caro,mas como sempre disse em vida, para ser gênio basta enxergar o óbvio!!! E avisa o Eduardo Santanna para deixar de ser transviado...-nesse momento acordo em sobressalto, ao meu lado uma revista Veja com Palocci na capa.

terça-feira, 10 de maio de 2011

Viva Cauby!!!!

Escrito  em  Setembro de 2005

Assistir Cauby no Bar Brahma é uma experiência única. Tudo começa com imensa cafonice e tristeza, chegamos a esquina da Ipiranga com São João,outrora puro glamour,hoje decrépita. Mendigos defecam no meio da rua, travestis siliconados se dirigem aos seus pontos,tudo isso contrastando com a classe média que chega ao bar saltando de Voyages e Caravans Diplomata, velhas de mocotó grosso trajando vestidos de festa rubros com broches de borboleta dourados ao peito,sapatos prata,meias grossas prevenindo a ruptura de imensas varizes cor de orquídea,senhores de ternos da Garbo com perucas acaju gritam com as mulheres em linda impaciência conjugal,o cheiro de perfume velado domina o local. Somos conduzidos ao nosso lugar num canto próximo ao palco, na mesa ao lado o sofista DiGênio (xodó do Militar)pede uma picanha no "rechaud" (nova mania da classe média,como os rondellis em buffets baratos de casamento,como as tábuas de frios de outros tempos), a carne chega espalhafatosa,despejando no ambiente fechado uma densa fumaça gordurosa que impreguina os cabelos fofos de bolo das velhas de reluzentes dentaduras de égua,a impressão geral é a de um crematório. Um senhor de aproximadamente duzentos e trinta anos começa a tossir desesperadamente atrás de mim,sinto perdigotos geriátricos atingirem minha nuca, meu chope espuma como se atingido por chuva,peço outro e desejo sinceramente que o ancião morra em agônica apinéia,o tempo passa e nada do cantor "Ronald Mcdonald" chegar.Boatos correm a boca pequena,o homem anda mal de saúde dizem uns,outros reclamam,será que esse porra vai morrer logo hoje que nos deslocamos da Mooca até aqui?
De repente o bar para,todos se levantam e então surge Cauby,trajando um blazer de lantejoulas douradas,os aplausos ecoam desvairados,alguma louca grita chamando o "curinga" de lindo e então,sobre o palco a magia acontece.
Cauby é visualmente uma mistura de Little Richard com Tom Jones, a voz evoca os grandes crooners do passado,Bing Crosby,Sinatra,Bennet e claro Tom Jones, o repertório é pop da melhor qualidade, indo dos clássicos próprios como Camarim e Conceição até lendas do boa cafonice internacional como I Just Called To Say I Love You e She de Charles Aznavour.Durante o show o ambiente macabro entra em pausa, a música domina o terror anterior, como um flautista de Hamelin Peixoto conduz a todos para um passado de beleza e amor,onde as velhas ainda não possuíam as doloridas joanetes,onde os paus dos velhos subiam em direção aos céus da excitação sexual. Cauby encerra o show cantando My Way, sim o velho Cauby Peixoto fez tudo a sua maneira, se vestiu como um clown efeminado,estourou nos Estados Unidos e acabou terminando a sua carreira num bar na porta da boca do lixo,porém todos o aplaudem de pé,alguns choram,todos ali o amam,inclusive eu.Yes,he did it in his way.

quarta-feira, 4 de maio de 2011

Literatura de porrada!

Chuck Palahniuk é um escritor originalissímo. No Brasil é conhecido pelo middle-brow por Clube da Luta do qual escreveu o romance que originou o filme, porém sua produção literária é vasta, no país já temos uma meia dúzia de romances do rapaz editados.
O que diferencia a literatura de Chuck da massa de papel publicada atualmente, principalmente em terras estadounidenses (creiam, a quantidade de títulos é espantosa) é um certo caráter figadal, as obras de Palahniuk atingem o coração de uma sociedade medíocre que insiste em esconder suas pulsões sob máscaras,o escritor realiza istto através de personagens como o alter ego ambulante Tyler Durden de Fight Club que realiza as pulsões incofessáveis de seu corpo ou os personagens de Assombro, um grupo de escritores de horror que ao se reunirem num solar para um concurso de contos liberam todas as suas perversões num festim de orgia, sangue e canibalismo. Para Chuck o homem é um animal sempre acuado por leis que o impedem de viver plenamente e que a qualquer oportunidade essas feras se libertam com consequências desastrosas para elas mesmas e para os outros, é uma espécie de bio-anarquismo, os instintos no final sempre vencem.

segunda-feira, 2 de maio de 2011

Aviões,Trens,Automóveis e Amizade


Seguindo uma indicação de Roger Ebert de seu livro Grandes Filmes assisti a Antes Só do Que Mal Acompanhado(Planes,Trains & Automobiles,1987) de John Hugues e o prazer foi grande.Meu desprezo pela película sempre se deveu ao preconceito puro,achava que o filme era somente mais uma comédia rotineira estrelada por Steve Martin nos anos 80,como Trocando as Bolas e Roxanne,mea culpa,mea culpa,o filme é uma jóia,uma dessas delícias próprias para as tardes de domingo (costumo incluir nessa categoria alguns filmes de Mike Nichols como A Difícil Arte de Amar,Secretária de Futuro e Lobo).São filmes luminosos,bem-humorados que muito falam sobre a condição humana,colírios para a nossa miopia cotidiana.
Em Antes Só Steve Martin faz o papel de Neal Page,um burocrata do marketing que esta saindo de Nova Iorque para encontrar a família em Chicago a dois dias do Thanksgiving,porém a viagem não vai dar certo,haverá escassez de táxis,pousos e decolagens prejudicados pelo mau tempo,trens enguiçados entre outros empecilhos.Como companheiro desta jornada Page encontrará Del Grifith (John Candy em sua melhor atuação) um vendedor de argolas para cortinas de banheiro,gordo,desajeitado e inconveniente,que clama ser amado somente por sua esposa,carregando um enorme baú (objeto o qual descobriremos o significado metafórico somente no final da trama)que contribuirá para as agruras do personagem de Steve Martin. Temos aí uma comédia de erros com risos abundantes,como Perdidos em Nova Iorque (Out Of Towners com Jack Lemmon)em que nada dá certo,porém percebemos que o filme de Hugues é muito mais do que isso.Após dois dias na estrada Page se despede de Grifith numa estação de metrô de Chicago, o personagem de Martin então,se refestela num banco do metrô aliviado por estar no final de tão conturbada jornada,por ter se livrado de Grifith,fecha os olhos e relaxantes e prazeirosas imagens de sua família surgem em sua mente,porém essas imagens se mesclam com lembranças dos momentos vividos ao lado de Del Grifith,momentos de ação e riso,momentos que mesmo involuntariamente fizeram com que Page saísse de sua vidinha burocrática de executivo,aquele homem chato, apesar de tudo, havia se tornado um amigo.Num segundo insight Martin percebe o porque do personagem de Candy ser tão grudento,ele se recorda de uma série de incongruências do discurso de Grifith sobre a sua mulher,sim,não existia mulher alguma,Grifith era um solitário e aí descobrimos o significado do baú,o objeto representa a dor que o homem carrega,a dor da perda da mulher amada,morta oito anos antes.Temos aí um filme sobre a amizade,ninguém neste mundo é perfeito e a maior parte dos nossos defeitos tem um motivo,muitas vezes motivos que preferimos manter escondidos,ser amigo de alguém é fazer vista grossa a estes defeitos e tentar corrigi-los quando possível,a amizade é mais um ato de amor incondicional ao qual devemos nos submeter na nossa existência.Page volta a estação e encontra Grifith sozinho,desamparado,sentado em um banco da estação,momentos depois vemos os dois homens chegando a casa de Page,Grifith divide o peso do baú com Page,cada um segurando uma alça,o almoço de Ação de Graças esta prestes a ser servido,Page apresenta o amigo com orgulho aos familiares acolhendo-o no amago de seu lar,ao lado de seus entes mais amados,Grifith sorri deliciado e nós choramos de emoção. A amizade entre os dois homens esta selada,o nosso amor por Antes Só do Que Mal Acompanhado também.